Guia prático: gestão financeira para consultórios médicos
01 de setembro de 2016 Por TMEBR'
Gerir um consultório médico é como gerir qualquer negócio. É preciso desenvolver habilidades de administrador, liderar a equipe e, sobretudo, fazer uma boa gestão financeira.
A gestão financeira abrange mais do que manter um conjunto preciso de controles e equilibrar a conta corrente. Ela requer uma estratégia de planejamento de gastos e investimentos, projeções de curto, médio e longo prazo, além do estabelecimento de metas e objetivos. Assim, as responsabilidades de gestão financeira afetam todos os aspectos de um negócio. Um consultório que atende a muitos pacientes, mas que tem má gestão financeira, pode ser menos lucrativo do que outro que tenha um fluxo menor de clientes, mas sabe controlar bem as finanças.
Acontece que nem sempre o dia a dia de um médico permite o tempo necessário para fazer uma gestão empresarial 100% otimizada, muito menos acompanhar as finanças da forma ideal. O desafio é buscar aprimorar sempre a capacidade de administração sem que isso se torne um fardo e sem que atrapalhe a principal atividade: a medicina.
Quais são, afinal, os aspectos que devem ser considerados para que a saúde financeira do consultório esteja sempre em dia? O que é preciso saber para que o fluxo de caixa seja eficiente? Quais são os maiores erros de gestão de finanças que devem ser evitados no consultório médico? Você já deve ter feito, em algum momento, perguntas como essas, o que é muito positivo e mostra que sua visão vai além do ofício de médico.
É sobre tudo isso que conversaremos neste guia prático. Você verá aqui os pontos-chave que garantem o sucesso financeiro, os equívocos que devem ser prevenidos e corrigidos e também terá algumas dicas práticas para otimizar os resultados em rentabilidade e lucratividade. Acompanhe!
Fluxo de caixa: acompanhe a movimentação financeira do seu consultório
O fluxo de caixa é uma importante ferramenta para acompanhar a situação financeira da clínica mês a mês. É por meio dele que é possível mensurar os resultados (lucro, prejuízo, crescimento, entre outros), pois no fluxo de caixa são lançadas as informações necessárias para um controle estratégico das finanças.
Também é pelo acompanhamento do fluxo de caixa que se consegue projetar gastos e ganhos, na medida em que ele dá um panorama ideal de como está a rentabilidade do negócio. Ele abrange o livro-caixa (que veremos a seguir) e exige um pouco de rigor e disciplina, já que qualquer dado financeiro que não seja lançado no livro pode alterar toda a contabilidade e resultar em números irreais.
O ideal é que o fluxo de caixa seja incorporado aos processos de gestão, faça parte do dia a dia administrativo e gere informações úteis para a tomada de decisões e a otimização da saúde financeira do consultório.
Veja algumas dicas valiosas:
- Determine um período para o seu fluxo de caixa (mensal, semanal, quinzenal);
- Crie centros de custos para agrupar despesas e orçamentos;
- Evite que muitas pessoas tenham acesso ao fluxo de caixa ou o manipulem;
- Use soluções tecnológicas para acompanhar o fluxo de caixa, imputar dados e evitar erros e retrabalhos;
- Utilize um livro-caixa para detalhar entradas e saídas.
Livro-caixa: controle gastos e rendimentos do seu consultório
Para começar, é importante saber que se o seu consultório (ou clínica) está registrado junto à Receita Federal como optante pelo Simples Nacional, a lei 9.317 de 1996 estabelece o livro-caixa como obrigatório. E, nesse caso, existem algumas formalidades que devem ser cumpridas (lançamentos diários, por exemplo).
De qualquer forma, mesmo que não seja uma obrigação, o livro-caixa é muito útil para a gestão financeira. Ele é o local em que são controladas todas as entradas e as saídas de dinheiro de um negócio, que permitirão a viabilização do fluxo de caixa. É nele que são controlados os recebimentos e os pagamentos que o consultório faz, sempre em ordem cronológica (dia, mês, ano). Também serve como auxiliar de registro contábil.
Para que o livro-caixa tenha um efeito positivo na gestão das finanças, é preciso que as anotações sejam metódicas, diárias e detalhadas. Ele não é um local para anotações de futuros rendimentos (notas que ainda não foram compensadas e cheques pré-datados, por exemplo).
A estruturação e o preenchimento do livro-caixa são muito simples. Contudo, algumas peculiaridades devem ser consideradas. Confira a seguir.
Organizando o livro-caixa para a gestão de finanças
Imagine seu livro-caixa em uma planilha. Nesta planilha, devem constar as seguintes colunas:
Coluna 1: Data
Nessa coluna, devem constar as datas (dia, mês e ano) dos dois tipos de eventos: as entradas e as saídas.
Coluna 2: Histórico do evento
Ao lado da data, segue uma breve descrição do evento, somente o suficiente para que o profissional que controla o livro-caixa entenda do que se trata. Por exemplo: “Pagamento de boleto para fornecedor X” ou “Recebimento de consulta do paciente Y”.
Coluna 3: Entradas
Nesta coluna, devem ser lançados os valores de recebimentos referentes à data e ao histórico descritos nas colunas 1 e 2.
Coluna 4: Saídas
Nesta coluna, constarão os valores referentes a pagamentos.
Coluna 5: Saldo
O saldo do dia deve ser a última coluna. O valor do saldo é, logicamente, o total da equação: entradas – saídas. Este valor, no próximo dia, virá como o primeiro evento da planilha, de modo que o saldo dia a dia contemple as entradas e as saídas dos dias anteriores e facilite a contabilidade ao final do período controlado.
Exemplo de livro-caixa diário:
Data |
Histórico |
Entradas |
Saídas |
Saldo |
01/08/2016 | Saldo do dia anterior | R$ 10.000,00 | ||
01/08/2016 | Pagamento de fornecedor (em dinheiro) | R$ 4.300,00 | R$ 5.700,00 | |
01/08/2016 | Depósito do FGTS da colaboradora Regina (número do depósito) | R$ 590,00 | R$ 5.110,00 | |
01/08/2016 | Recebimento de consulta do paciente Pedro Henrique | R$ 280,00 | R$ 5.390,00 | |
01/08/2016 | Recebimento de duplicata (número da duplicata) | R$ 2.000,00 | R$ 7.390,00 | |
01/08/2016 | Pagamento do fornecedor em cheque pré-datado (número do cheque) | R$ 400,00 | R$ 6.990,00 | |
01/08/2016 | Recebimento de exames clínicos | R$ 2.280,00 | R$ 9.270,00 |
É muito importante que todos os lançamentos, sejam de entrada ou de saída, tenham documentos comprobatórios (notas e cupons fiscais, recibos, etc). Também é importante que o livro-caixa não contenha erros ou rasuras, para evitar o desencontro de informações e a perda do controle das despesas e dos recebimentos.
O ideal é fazer o controle de livro-caixa por meio de um software especializado, mas, com cuidado e organização, nada impede que esse controle seja feito por meio de planilhas de forma muito efetiva.
7 erros fatais que você deve evitar na gestão financeira do seu consultório
Agora que você já refletiu sobre o fluxo de caixa e o livro-caixa, podemos conversar um pouco sobre os erros fatais que devem ser evitados na gestão financeira de um consultório médico.
Perceba que tais erros geralmente são cometidos porque a gestão das finanças é deixada em segundo plano, geralmente pela falta de conscientização de que um consultório médico é um negócio como qualquer outro. Acompanhe:
1. Não precificar estrategicamente os serviços
Calcular corretamente os preços ideais dos serviços prestados no consultório não é tarefa simples. Não significa que seja impossível. Muito pelo contrário: ter métodos de precificação é essencial para garantir a lucratividade e o sucesso do negócio.
Ao pensar nos preços de uma forma muito subjetiva, é frequente que médicos acabem cobrando valores muito abaixo ou muito acima do mercado, o que pode influenciar negativamente sua competitividade.
Matematicamente falando, é preciso pensar em todas as despesas envolvidas em cada serviço prestado (custos fixos e variáveis) e também no valor do seu trabalho (geralmente definido por horas). A subjetividade, nesse caso, só vale para determinar o valor da sua reputação no mercado (tempo de experiência, sucesso em resultados para os pacientes, imagem profissional, entre outros).
2. Não acompanhar a produtividade da equipe
Ter um time mal gerenciado pode sair muito caro para o consultório. Isso porque nem sempre é simples mensurar a produtividade de cada profissional. E isso fica ainda mais difícil quando há muitas pessoas para serem lideradas.
Geralmente incorre-se nesse erro quando os processos não estão bem definidos e quando não há nenhuma ação de gestão de desempenho. As pessoas realizam as tarefas da maneira que querem e não são cobradas por entregas específicas em seu dia a dia de trabalho.
Quando isso acontece, é preciso fazer novas contratações, onerar a folha de pagamentos e, em médio e longo prazo, até arcar com despesas pela rotatividade de colaboradores (insatisfeitos, eles tendem a mudar de emprego).
3. Não ter um bom controle de compras
Da mesma forma que se deve controlar despesas fixas e variáveis, é preciso ter total controle do que o consultório tem em estoque em matéria de insumos, materiais de escritório, etc. Comprar a esmo pode acarretar em despesas desnecessárias e desperdícios.
Esse erro também está muito relacionado com a não capacidade de fazer boas negociações com fornecedores. E isso, atualmente, com a maioria das empresas atendendo via internet, é um pecado grave. Já não é mais aceitável avaliar um único fornecedor, já que há muitas informações disponíveis on-line para cotações e negociações.
4. Desconhecer a legislação tributária e fiscal
Como a legislação tributária e fiscal no Brasil é extremamente complicada, é possível que você esteja pagando impostos desnecessários. Também é perfeitamente factível que você incorra em erros que acabem gerando multas e prejuízos financeiros.
É importante lembrar que os órgãos governamentais irão bater na sua porta sempre que sentirem que estão no prejuízo, e nunca para devolver dinheiro.
5. Não ter um valor fixo de pró-labore
Esse é um erro que acontece muito em consultórios e clínicas nos quais vários médicos são sócios, mas também pode acontecer quando se trata de um único profissional: deixar o pró-labore “no ar”.
Sem um pró-labore pré-estabelecido, é possível que o médico (ou os médicos) acabe desnorteando as despesas do consultório por não gerir bem suas próprias finanças. Afinal, sem saber quanto ganharão no final do mês, podem fazer mais despesas pessoais. Isso pode fazer com que o fundo de reservas do negócio seja vilipendiado e também dificultar a projeção de ganhos futuros.
6. Não conhecer o ciclo financeiro anual do consultório
Há períodos no ano em que o fluxo de atendimentos pode diminuir ou aumentar. Sem conhecer e sem pensar nesses ciclos, fica difícil fazer projeções, estimar investimentos, despesas e rendimentos. E isso pode acarretar gastos desnecessários e até prejuízos.
Um exemplo: ao saber que em um determinado mês o número de consultas cai significativamente, o médico pode dar férias para um auxiliar e uma secretária. Sem essa visão antecipada, ele pode deixar sua equipe ociosa e acabar liberando os profissionais em um outro período do ano em que eles seriam muito necessários.
7. Não ver o atendimento como parte estratégica do negócio
Não ter um bom trabalho de atendimento antes e depois que o paciente sair do consultório dificulta a fidelização da clientela. E isso, em médio e longo prazos, pode se transformar em prejuízos.
Assim como em qualquer outro tipo de negócio, um consultório ou uma clínica médica deve prezar pela manutenção de uma carteira de clientes ativa. Isso porque, além de voltar sempre, os pacientes tendem a fazer o marketing boca a boca (positivo ou negativo), especialmente porque se trata de um serviço em que a confiança e o bem-estar são fundamentais.
7 dicas para otimizar a gestão financeira do seu consultório
Da documentação das transações ao ganho de conhecimentos em finanças, vamos agora a algumas dicas práticas para que a gestão financeira do seu consultório seja eficiente.
1. Documente todas as transações financeiras
Coloque em prática o fluxo de caixa e faça todos os registros de entradas e saídas no livro-caixa. Seja o mais detalhista possível com todos os gastos e recebimentos. Anote tudo, desde a simples compra de papel até os recebimentos em cheque, cartão de crédito, passando por despesas fixas (aluguel, condomínio, energia elétrica, água, etc) até as variáveis (contratação de serviços emergenciais, por exemplo).
Quanto mais documentados forem as transações financeiras que seu consultório faz, melhor será o seu controle financeiro. Fazendo isso, você poderá calcular corretamente o custo de manutenção do consultório e também visualizará com mais facilidade os retornos sobre os investimentos e a lucratividade.
2. Faça projeções de gastos e lucros
Também é importante criar o hábito de planejar os custos e os lucros que você almeja aferir com seu consultório. Isso fica mais fácil quando há bastante controle, mas exige um pouco de visão analítica e uma administração mais pragmática.
A partir do momento em que você começar a fazer projeções, verá que fica mais fácil elaborar planos de ações, otimizar o tempo, organizar sua agenda para atender mais pacientes, entre outras atividades. Isso também vale para os esforços de diminuição de custos.
Estabeleça metas a serem atingidas e engaje seus colaboradores para que todos trabalhem com os mesmos objetivos. De preferência, mostre os benefícios dessa gestão mais estratégica. Isso fará com que as pessoas se sintam mais animadas em contribuir para o que for projetado.
3. Mantenha um fundo de reserva
Qualquer negócio está sujeito a imprevistos financeiros, seja pelo surgimento de um gasto inesperado, seja pela queda do número de clientes. Isso não é diferente no ramo da saúde. Por isso, reservar um fundo para ser utilizado em momentos de apuros também é uma ótima tática de gestão financeira.
O ideal é reservar um valor mensal para ser guardado nesse fundo e utilizá-lo somente em casos de extrema necessidade. Tudo que puder ser negociado com fornecedores para prazos mais longos e flexíveis não precisa ser pago com o fundo de reserva.
4. Separe suas despesas pessoais dos gastos do consultório
É importante ter em mente que o caixa do consultório não pode ser confundido com sua carteira pessoal. Evite misturar a pessoa física com a jurídica, pois isso pode resultar na perda do controle das finanças e, consequentemente, acarretar prejuízos em médio e longo prazos.
A melhor forma de fazer isso é ter um pró-labore fixo ou estabelecer um percentual dos ganhos mensais como pró-labore — o que também pode estimulá-lo a potencializar os resultados ao longo do mês para que o ganho seja maior.
5. Contrate os serviços de um profissional de contabilidade
O Brasil é um dos países com maior complexidade tributária e fiscal do mundo. Logo, há uma série de detalhes legislativos que podem fugir do seu controle. Por isso, é importante contar com um contador para ajudá-lo com as questões burocráticas da gestão financeira do seu consultório.
Certifique-se de que o contador que você contratar tenha experiência com consultórios médicos. Isso fará toda a diferença, pois você não precisará perder muito tempo explicando detalhes inerentes à sua atividade profissional.
6. Use a tecnologia
As ferramentas tecnológicas estão cada vez mais acessíveis e eficientes. Assim, aproveite as facilidades da tecnologia (softwares, aplicativos) para automatizar seus controles, evitar erros e retrabalhos e, sobretudo, gerar relatórios que te ajudem a tomar decisões baseadas em informações precisas.
Use a tecnologia para encurtar o tempo que você precisaria dedicar consolidando e analisando diversas planilhas, por exemplo. Quanto mais automatizada for a gestão da clínica ou consultório, mais você poderá se dedicar ao que realmente importa: prestar o melhor atendimento aos seus pacientes e, muito importante, otimizar a produtividade da sua equipe.
7. Aprimore seus conhecimentos em gestão financeira
Por fim, conscientize-se de que é preciso aprimorar seus conhecimentos em gestão financeira de negócios. Busque fazer cursos rápidos sobre o assunto e conversar com profissionais de administração e contabilidade.
Aproveite a imensidão de conteúdos disponível na internet em texto, áudio e vídeo para sanar todas as suas dúvidas e obter insights que te ajudem a melhorar a administração financeira do seu consultório.
Verifique se na associação de profissionais médicos da sua cidade existem cursos, workshops e palestras sobre finanças. Você pode aproveitar esses eventos para fazer benchmarking (avaliação do negócio em relação à concorrência) com outros médicos, trocar ideias e aprender com as experiências deles.
Gerir bem as finanças do consultório é a melhor forma de prosperar
Assim como em qualquer empresa, a gestão financeira envolve manipulação de operações de rotina, tais como a negociação de contratos, o pagamento de despesas, os recebimentos, a cobrança, etc. Em um olhar mais executivo da empresa, ela também pode fornecer informações para fazer planos estratégicos que preparem o consultório para o futuro. Ao controlar as finanças, criam-se históricos gerenciais que podem ajudar a visualizar os fluxos anuais de movimentação financeira, atendimento, taxas de ganhos e perdas de clientes. Isso tudo é insumo para o planejamento estratégico de médio e longo prazo.
Como vimos ao longo deste artigo, é preciso dar uma atenção mais cirúrgica à gestão financeira do consultório, pois é ela que, em última instância, irá determinar o sucesso do negócio. Evitando erros e otimizando os controles, é possível fazer com que os serviços sejam melhor precificados, os custos sejam melhor projetados e controlados e, sobretudo, os prejuízos sejam evitados.
Outro ponto que merece destaque é a mensuração dos resultados. Por mais que todos os controles sejam feitos da forma correta, é preciso sempre avaliar os retornos que o consultório está tendo. Isso tanto em matéria de quantidade de clientes atendidos, satisfação dos pacientes, quanto no que diz respeito aos lucros obtidos com os serviços prestados.
A capacidade analítica do gestor do consultório deve ser sempre aprimorada, pois só assim será possível pensar o negócio em médio e longo prazo. Somente com uma visão estratégica é possível perceber os riscos financeiros, estabelecer metas e fazer projeções para que os resultados sejam melhorados gradativamente, blindar o consultório contra os riscos financeiros e estabelecer metas que tragam crescimento de receita.
E isso tudo requer uma gestão de pessoas também estratégica. Não importa o tamanho da sua equipe, você deve pensar mais do que um médico: deve ver-se e colocar-se como um líder motivador, que vê no apoio de seus colaboradores também uma forma de manter as finanças do consultório sempre saudáveis. Afinal, sem o engajamento de quem te cerca, você perderá muito tempo fazendo trabalhos operacionais, e isso pode prejudicá-lo no essencial: desempenhar sua função primária da melhor forma possível.
Como está a gestão financeira do seu consultório médico? Gostou das dicas que nós preparamos? Compartilhe sua opinião e suas experiências com a gente nos comentários!